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Nem sequer são obras de Santa Engrácia, porque ainda nem saíram do papel, mas certo é que a nova piscina municipal de São João da Madeira arrisca ser um ‘sumidouro’ de dinheiros públicos antes de sequer ser lançada a primeira pedra. Em 2011, era então presidente da edilidade o actual ministro da Coesão Territorial, Castro de Almeida, um concurso de ideias ganho por Souto de Moura resultou num contrato de 250 mil euros para o projecto de arquitectura e de especialidade. Porém, a falta de consenso político ‘abortou’ a obra, orçada inicialmente em 4,5 milhões de euros, mas que antes de qualquer pedra lançada, em 2016, já subirá para os 5,7 milhões. Agora, liderada pelo Partido Socialista, a autarquia do distrito de Aveiro ‘ressuscitou o sonho’ e, mesmo sem garantias de financiamento nem prazo de execução, deu um novo passo: pediu alterações ao projecto a Souto Moura. São mais 150 mil euros.
Corria ainda o ano de 2011, e Eduardo Souto Moura, que acabara de ser então galardoado com o prestigiado Prémio Pritzker de Arquitetura, tinha razões para festejar: vencera um concurso público para a concepção do projecto de arquitectura das piscinas municipais de São João da Madeira. A selecção fora feita a partir de 46 candidaturas, e o ‘prémio’ consistia num contrato de praticamente 250 mil euros, que incluía o projecto de arquitectura propriamente dito e os projectos de estabilidade e de especialidade, incluindo das componentes de segurança e energia.
Implicando uma empreitada estimada inicialmente em 4,5 milhões de euros, a nova piscina coberta de São João da Madeira seria o quarto projecto que Eduardo Souto Moura desenvolvia para este município do distrito de Aveiro, e estava prevista a sua construção no Complexo Desportivo Paulo Pinto, substituindo o antigo equipamento em funcionamento desde os anos 80 do século passado.
O contrato para a execução do projecto foi assinado em Maio de 2012 por Souto de Moura e Castro Almeida, o actual ministro da Coesão Territorial, que então presidia à edilidade de São João da Madeira. No momento da apresentação do projecto, em Setembro de 2014, o custo previsto já saltara para os 5,3 milhões de euros, mas apontava-se como justificação os investimentos para poupança energética, sendo que esta seria a primeira piscina coberta da Europa com certificação internacional LEED (Leadership in Energy and Environmental Design).
Porém, apesar de ser ter cogitado um pedido de empréstimo de cerca de dois milhões de euros ao Banco Europeu de Investimento, “não foi alcançado o consenso político necessário na Câmara Municipal, entre as diferentes forças políticas, e a realização da obra não foi aprovada”, salienta fonte da autarquia agora liderada pelo socialista Jorge Vultos Sequeira, que assumiu funções em 2017.
E o projecto ‘ressuscitou’. Ou melhor dizendo, teve de ‘renascer das cinzas’ com uma injecção de mais 155 mil euros para Souto Moura alegadamente ‘renovar’ um projecto de arquitectura das novas piscinas que, a surgirem, ainda não têm um custo previsto de empreitada. A autarquia socialista diz ser necessário ainda, para agora avançar com a construção de piscinas que já tinham projecto definido por Souto Moura, “adequar este projeto, com data de 2012, a normas e regulamentos actualmente em vigor implementados por via de atualizações verificadas durante os últimos 12 anos, isto é, aprovadas em momento posterior à elaboração do projeto inicial”, designadamente de ordem técnica e organização funcional.
No sentido de justificar a nova ‘chamada’ de Souto Moura, a autarquia aponta, aliás, para uma portaria de Dezembro do ano passado sobre requisitos técnicos e de funcionamento gerais das instalações desportivas de uso público e também de nova normas de poupança energética. E destaca mesmo, em concreto, as actualizações necessárias ao nível tanto das estruturas como das instalações hidráulicas como de sistemas de energia e de segurança.
Contas feitas, aparentemente, nada será aproveitado do projecto de arquitectura anterior, embora no contrato de 2014 tivessem sido discriminados os custos de cada projecto de especialidade. Por exemplo, o estudo do comportamento térmico, incluindo declaração de conformidade regulamentar, ficou orçado em 5.338 euros, e a certificação LEED custou, no ‘bolo’ dos 250 mil euros recebido por Souto Moura, valeu 23.375 euros.
Na verdade, de acordo com o contrato de 2014, as obrigações de Souto Moura já tinham ‘prescrito’ há muito. Nesse contrato, o arquitecto comprometia-se a conceder assistência técnica durante a execução da empreitada, mas ficava desobrigado dessa tarefa caso essa fase não fosse iniciada nos três anos seguintes à aprovação do projecto de execução. A opção passaria assim por um novo concurso de ideias ou por uma adjudicação por ajuste directo a Souto de Moura. A opção da autarquia socialista foi a segunda, entregando ao Prémio Pritzker mais um cheque de 155 mil euros.
Apesar de evidenciar a existência de condições políticas para avançar com as novas piscinas – o Partido Socialista tem maioria na autarquia –, não se sabe ainda quanto custará a execução do projecto. Fonte oficial da autarquia admitiu ao PÁGINA UM que, apesar de não haver comparticipação europeia nos investimentos em infra-estruturas desportivas, o projecto é mesmo para avançar, mesmo não se sabendo o custo, que em 2016 se estimava já em 5,7 milhões de euros sem haver ainda uma pedra metida.
“Naturalmente, o valor da concretização de um projeto que tem cerca de 12 anos, aos preços de hoje, ser[á} mais elevado”, admite a autarquia de São João da Madeira, acrescentando que “a estimativa do novo valor será conhecida após a actualização do projeto”. Quanto à previsão para o início da empreitada”, a mesma fonte diz ser “prematuro” indicar uma data, “atendendo a todo o processo que se seguirá”, incluindo o prazo de 120 dias para Souto Moura alterar o projecto, a aprovação pelos diferentes órgãos autárquicos, a operação de financiamento, o lançamento de concurso da empreitada e o visto do Tribunal de Contas.
Em suma, por agora, o único a ganhar com a ‘mítica’ piscina de São João da Madeira é Souto Moura, uma individualidade particularmente crítica do poder local, que soma agora 400 mil euros em dois projectos de Arquitectura. E o adágio popular diz que ‘não há duas sem três’.
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