A grande conversa universal
Rodeio-me naturalmente daquilo que considero belo. É, em
geral, a natureza, quero dizer, a paisagem e aquilo que os homens criaram para
o seu bem-estar e que embelezou a paisagem e os recantos recolhidos onde gosta
de viver.
Há aí coisas delirantemente feias e há coisas belas, é a
minha opinião, nunca chegaremos a acordo quanto a isto. Nunca chegaremos a
acordo quanto às qualidades e às características da maior parte dos objectos e
dos acontecimentos deste mundo.
Mas estou a simplificar de forma desconcertante.
Se me for possível, e faço por isso, vou ver o pôr-do-sol
incandescente, eternamente único, há uma ínfima diferença de detalhe, cada dia.
Vou vê-lo. Isso me satisfaz ao ponto de me sentir feliz por poder contemplá-lo,
sem mais, sem pensamentos entrelaçados que são, por vezes, tremendamente
asfixiantes.
Fico tranquila e tento ver com singeleza o que lá está.
Não é apenas o poente que me dá este conforto. Todas as
belezas que os Poetas celebram merecem que eu as exalte, merecem ser
celebradas.
A Lua de há dias, plenamente luminosa no céu, espelhou no
mar como um sol, em plena noite.
É o Céu com as magníficas constelações de estrelas que
muitas vezes o decoram e o iluminam.
O Mar triunfante ou pacífico, com ou sem transparentes
rendas brancas sumptuosas, com reverberações e desenvolturas, e invulgares
brilhos irradiantes e mesmo ofuscantes.
Do outro lado, a majestade das montanhas com os cumes cada
vez mais altos, desejosos de se aproximarem do céu ou da divindade. E os
rios e os riachos sinuosos, amorosos, sensuais.
Sou facilmente seduzida pelo silêncio, por certas alusões
enigmáticas, pela musicalidade leve que nem sempre é macia e pelas ilusões que
se perseguem.
É um espectáculo megalómano talvez aquele de que falo e que
prezo, mas também é mágico.
Nenhum tédio palavroso de alguém menos prevenido me leva a
parar para escutá-lo.
As fealdades (torpezas, indignidades, hediondezas…) não me
cativam nem na natureza nem nas obras construídas ou criadas pelos homens. Por
isso, não gosto de obras de arte contemporânea que em geral apresentam uma
visão do mundo catastrófica, carregada de ruídos anacrónicos, de sombras e de
monstros fazendo esgares.
Não quero saber, não escreverei sobre essas experiências de
tristes realidades. Não esbanjo o meu tempo com contemplações tais.
Ruídos… só aprecio, comovida, os das asas dos pássaros que
por aqui passam em bandos copiosos, ao fim do dia, a caminho do seu poiso
habitual no Parque, do recolhimento. Às vezes, parecem sussurrar…cantar
pianinho. Ou talvez sejam apenas ecos, o que ouço, ecos luminosos, sem dúvida.
A perfeição… já não pretendo
topar. Quiçá essa busca de perfeição seja essencial para a ciência progredir.
Podia dizer: procuro mas sei que não encontro. E não me importo com esse
progresso… Seria em que sentido?
Não, não darei forma a outros mundos, não ajudarei a
criá-los. Não tenho esperança de...
O que, por vezes, ainda procuro é
o sentido tão disperso do mundo. De resto, é esse o progresso que ainda desejo.
Eis as melhorias apetecidas: assim… que haja debate para
formulação de ideias novas; debate lúcido, autêntico, livre, desinteressado e
intuitivo. O debate sereno da Filosofia.
É o meu simples compromisso com seja o que for.
Na minha contemplação deste mundo tal como o vejo hoje,
há motivos suficientes para o amar.
Encontrei, sim, a serenidade.
Zilda Cardoso
Porto, Portugal
qui 07-12-2017 08:57